Corações e Cérebros

Há muitas coisas que podemos apreender destes duros tempos pelos quais passamos. As mais importantes dizem respeito ao planeta e à vida na Terra, aos direitos dos animais e a manutenção dos espaços silvestres, à permanência de todos nós.

Com a chegada e a evolução da pandemia, ficou muito claro pra quem tem coração e cérebro que precisamos retroceder em nosso violento e desenfreado avanço sobre a natureza. Destruímos ecossistemas de infinitas espécies, botamos abaixo florestas, poluímos as águas, permitimos que os indígenas, que são seus protetores e mantenedores, sejam agredidos e aniquilados, devastamos uma riqueza insubstituível em nome do capital — ele que, no fim, não traz nada além de um luxo efêmero para muito poucos.

Assassinamos diariamente milhões de animais, planeta afora, pelo simples prazer de comer sua carne, sem que isso, nem de longe, sirva para estancar a imensa fome que se abate sobre hordas de gente espalhadas pelo mundo. Somos egoístas, destruidores, verdadeiros predadores. Quem não tiver consciência disso, não terá consciência de nada, pois essa é a questão mais fundamental de nossa permanência aqui, agora: não se trata apenas de nós, o mundo não existe apenas para nosso usufruto. 

Não somos os donos de nada e deveríamos ser os guardiões de tudo, de toda essa vida preciosa, uma vez que temos consciência e poder de ação. Deveríamos nos devotar à natureza e ser profundamente gratos por tudo que ela nos dá, incluída aí, evidentemente, a nossa própria existência que se encontra ameaçada justamente por conta de todos esses nossos equívocos, sandices, brutalidades.

Outra coisa que ficou muito clara, pra quem tem coração e cérebro, é que a arte não é algo supérfluo. Ao contrário: não viveríamos sem ela. Nos piores momentos da pandemia, quando não podemos sair de nossas casas, é ela, a arte, quem sustenta nossa sanidade. Quem teria suportado os 4 ou 5 meses que passamos entocados, quando o isolamento começou, sem um livro, sem um filme, sem música? O quanto a arte nos salva, não apenas do tédio, mas também da depressão, do sombrio da vida, da pequenez de espírito, da vileza, da mediocridade de um dia a dia apenas com atividades caseiras, propósitos e preocupações banais? 

Ficou claro, para quem tem coração e cérebro, que não vivemos sem criar e produzir, pois é assim que nos (re)inventamos, nos (re)conhecemos e compreendemos melhor, tanto o nosso caminho, como os dos outros. Através da arte, além de penetrar num universo prazeroso, de encantamentos, algo que nos protege em certa medida do horror da existência, de seu lado obscuro, podemos desfrutar de um alargamento de nossas percepções, adquirindo (auto)conhecimento, trabalhando nossa sensibilidade, trocando com os outros e nos deixando emocionar ao vivenciar o mundo além do nosso umbigo. 

Dessa forma, aprimorando nossa visão, nossa compreensão das coisas, nos aperfeiçoamos como indivíduos, tornando melhores nossas ações, nossos propósitos, nossas posturas e nossa relação com tudo aquilo que nos cerca.

2021 será apenas mais um ano. A vida de verdade não se dá nem se guia pelo calendário. Cabe a nós conceber e trabalhar esse novo ano para fazê-lo melhor. Para isso, precisamos de esperança, vontade e consciência. Quem sabe começamos refletindo sobre todas as coisas que estão na nossa cara, coisas fundamentais que nosso coração e nosso cérebro nos evidenciam há muito?

Podemos começar considerando comer menos carne, pois ninguém (ninguém mesmo!) tem necessidade de ingeri-la duas vezes ao dia, nos sete dias da semana. Diminuir seu consumo fará muito bem às pessoas, ao planeta, e poderá também ao menos diminuir um pouco do suplício que os animais enfrentam por nossa causa.

Podemos seguir meditando (até compreender de fato) que a arte e a cultura são inerentes a nós, fazem parte da nossa essência, da nossa razão de ser e que, sem elas não seríamos nada, não teríamos identidade nenhuma, apenas rastejaríamos à deriva pelo globo. A imaginação, que é a mãe de toda a arte, é o campo mais aberto de visão que dispomos e que nos faz avançar. Nós somos o que cultuamos.

Então, vamos nos cuidar e ser conscientes e solidários, o mais que for possível. Vamos enfrentar a pandemia pensando sobretudo nos outros: nas pessoas dos grupos de risco, nos hospitais lotados, nos profissionais de saúde que literalmente entregam e dedicam suas vidas para salvar as dos outros e que estão exaustos, física e emocionalmente. Sejamos realmente mais humanos tentando efetivamente exercitar a empatia, a identificação mútua, a sintonia com o mundo, com a vida.

Vamos aproveitar, usar melhor nosso cérebro e nosso coração. Certamente seremos mais alegres e afortunados, assim como o mundo que nos rodeia.

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