Agendas Astronômicas

Quando atuava no Planetário da UFRGS, uma de minhas tarefas recorrentes era criar e trabalhar as artes para as agendas astronômicas de cada ano.

Elas eram motivo de muitas pesquisas e trocas intensas — sobretudo com minha colega e amiga Sônia Coppini, com quem partilhava a sua elaboração (assim como de muitas outras produções) e que também era responsável pela parte de texto.

Num labor que se estendia por um bom período, as Agendas Astronômicas do Planetário da UFRGS eram muito aguardadas pelo público por conta das preciosas e diversas informações que traziam e que não eram assim tão fáceis de se obter. Além das fases da Lua e dos horários de nascer e ocaso do Sol, constavam outros informes de fenômenos visíveis no céu, como os planetas e as estrelas em destaque no período, chuvas de meteoros, eclipses, o começo dos equinócios e dos solstícios etc. Esse material era distribuído gratuitamente para as escolas e outros visitantes.

Compartilho e comento aqui, então, sobre algumas artes de capas de agendas que criei, dentre as que produzimos naqueles anos.

A primeira, de 1991, concebida ainda no tempo em que o processo de impressão das gráficas era realizado a partir de fotolito, foi elaborada a nanquim, artesanalmente. A arte da cor azul foi feita num papel vegetal, a da cor cinza noutro e a da amarela, ainda num terceiro. Após uma sequência de impressões das cores, separadamente, somando-se as três, obtinha-se a estampa final, completa e colorida. Para essa arte, especificamente, me baseei na estética de mapas antigos, trazendo uma “redução” de uma carta do hemisfério sul celeste, com suas principais constelações e estrelas.

A de 1992, com o Sistema Solar todo colorido e que marcou os 20 anos do Planetário Prof. José Baptista Pereira, foi criada nos mesmos moldes da anterior, com a separação de cada cor em diferentes artes. Complicada, por causa de seus detalhes e pelas várias sobreposições de cores, foi ainda maior a dificuldade de se conseguir uma precisão da imagem final impressa.

A terceira, de 1993, foi produzida nos (meus) primórdios da computação. Para poder executar o que eu tinha em mente, contei com a ajuda de meu irmão — que é engenheiro eletrônico e, à época, já entendia bastante desse tipo de recurso e possuía os equipamentos necessários. Primeiramente, fotografei a maquete do prédio do Planetário. Depois, ela foi recortada digitalmente e sobreposta num cenário criado por mim no computador. Sem apresentar um “conteúdo informativo”, o que eu buscava com essa capa era algo mais lúdico e que representasse ligeiramente uma das funções de um planetário: proporcionar visões e viagens a lugares inacessíveis. Assim, busquei dar a impressão de que o prédio era uma nave espacial pousada sobre algum distante e desconhecido planeta. Infelizmente a cópia que possuo sofreu com a ação do tempo e o violáceo do planeta acabou ficando um tanto manchado.

A seguinte, de 1994, foi criada de um modo bastante elementar e diferente das anteriores, usando o método da colagem. A Lua foi reproduzida e ampliada a partir do xerox de uma foto, a Terra, recordada de um impresso colorido e o fundo estrelado, sobre o qual colei os dois astros, foi pintado à mão. O que eu pretendia com ela era proporcionar uma visão inusual da Terra vista da Lua.

Já a de 1995/1996, que apresenta o zodíaco, foi executada usando ainda outra técnica, a da pintura com tinta acrílica sobre cartão. Inspirado numa reprodução em livro de uma antiga carta celeste hindu, na qual os signos se encontravam espalhados do modo como as constelações zodiacais se mostram no céu, o que fiz foi pintá-la organizando as figuras em círculo. No centro, coloquei um ícone comum a muitos povos. Para os nativos ameríndios, era algo que simbolizava a roda da cura e o eixo do mundo, em torno do qual tudo transita e transcende. Para os budistas, ele indicava a roda da vida. Além disso, essa imagem estava igualmente associada à própria roda do zodíaco. Para criar os motivos florais, mais uma vez me baseei na ornamentação da carta hindu e decidimos que, pela primeira e única vez, a capa da agenda não traria nenhum escrito: nada, a não ser a intensidade e beleza da imagem.

Para a capa de 1999, fiz um desenho à lápis do público prestes a assistir à sessão na cúpula do Planetário.

Na agenda seguinte, do ano 2000, por uma questão de contenção de despesas, abolimos capa e dobras, bolando um simples cartão quadrado, impresso dos dois lados, com os dados direto sobre um fundo que, numa face mostra a Terra e, na outra, a Lua.

Em 2002, a capa foi a reprodução parcial de uma carta celeste sem as figuras das constelações, novamente num processo demorado de composição da imagem. A partir de um modelo digitalizado, trabalhei a arte no computador, em três cores: azul, amarelo e magenta.

A última arte de agenda que apresento aqui, de 2003/2004, foi a que deu mais trabalho operacional. Há muito eu desejava fazer uma capa em formato redondo, mostrando a sala de projeções do Planetário vista de cima. Porém, pela necessidade de espaço pras informações, o impresso não poderia ser completamente redondo. O jeito foi fazê-lo com duas dobras. Fechada, a agenda se mostrava quase redonda; aberta, ficava com 4 partes circulares conectadas pelas bases. Pra criar a imagem, num tempo em que ainda não existiam os drones, tivemos que montar uma operação e tanto. Foi colocado um andaime na cúpula, rente ao projetor Spacemaster e alto o suficiente para que chegasse quase ao seu ponto mais alto, de onde o fotógrafo Miguel Canabarro clicou, primeiramente, uma metade da sala. Na sequência, o andaime foi desmontado e reerguido no lado oposto, onde ele tirou a foto da outra parte do espaço. E ele também registrou o projetor inteiro, visto de cima. Depois de batidas as fotos, foi feita a montagem do material. As duas metades da sala foram trabalhadas e unidas num programa de imagens, colocou-se a do projetor bem ao centro e… voilà ! Eis que criamos uma visão inédita da sala de projeções, como se a observássemos do alto, vendo as poltronas, parte da mesa de controle do operador e, bem ao centro, o magnífico Projetor Spacemaster.

Bons tempos aqueles, de preciosas trocas e belas criações.

8 comentários em “Agendas Astronômicas”

  1. Todas muito bonitas! Não conhecia ainda, uma pena, pois gostaria de ter tido todas elas.
    Parabéns pela arte!

  2. Nesses 12 anos em que você registrou seu trabalho no planetário, quanta coisa mudou na área tecnológica da ciência e da arte. Seu veio criativo, no entanto, permaneceu sempre.

    Tentei avaliar as produções, como se fosse pra um concurso, e tive muita dificuldade. Ia e voltava na pontuação. Mas arrisco uma classificação muito pessoal, das 3 que mais gostei. : A de 91 em primeiro, a de 1999 em segundo e a de 1995 em terceiro.
    Ah meu Deus… mas gostei tanto das outras também…..
    Melhor não classificar.
    Só olhar, e parabenizar o artista.

    1. ahahahah, Miroquinha querida, que ótimo isso do teu “ranking”… pois é, essa coisa da tecnologia é impressionante e as possibilidades artísticas também. gracias, querida! ⭐💕

  3. Luanaa Limaah

    Eu ainda tenho em algum lugar aquele Zodíaco Hindú, que tanto amei ! Passei por ele em alguma caixa, outro dia… Na próxima vez que achá-lo , vou emoldurar !!!
    Achei tão interessante o Centauro ” combater ” o Lúpus na primeira! Super icônico, para mim!!!
    Sempre fostes um artista completo, Dudu !!!!
    Adoroooo !!!!

    1. Lu querida, que legal que tens essa agenda com o zodíaco hindu. gracias pelo carinho e comentário! 😘✨💕

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